MANIFESTO CONTRA VIOLÊNCIA E EM DEFESA DA VIDA DIGNA
O povo paraense vive mais e mais sobressaltado e atemorizado pela crescente onda de violência que assola o estado. Os seqüestro-relâmpagos, sempre abomináveis, até então restrito às grandes capitais do sul e sudeste, já ocorrem de forma aleatória. Avolumam-se as estatísticas dos casos de assaltos seguidos de morte, como os que recentemente vitimaram o geólogo e pesquisador do Museu Paraense Emílio Goeldi, Rafael Nascimento Filho, e o sociólogo da Universidade Federal do Pará, Eduardo Lauande, ex-bolsista do Museu Goeldi. Os criminosos nada temem ao tirar a vida de um cidadão honesto e trabalhador, que se desloca rotineiramente do seu trabalho para o reencontro de sua família depois de um longo dia de labor. A divulgação sensacionalista da imprensa não estaria nos tornando anestesiados pelo bombardeio de informações de crimes que nos parece rotina? A impunidade estampada nos indigna e nos deixa impotentes para agir? Estamos nos tornando insensíveis à comoção dos familiares que perderam seus entes queridos, e que se tornou comum? Devemos lutar contra a violência e insegurança ou nos conformar com a situação e simplesmente nos aprisionarmos literalmente em nossas casas, reféns do medo?Estamos sitiados. A cada dia a sociedade está mais temerosa com a ação dos bandidos. O ser humano não tem valor nenhum enquanto pessoa. Para a criminalidade, seu valor é meramente aquilo que ela pode extorquir. Quem vive a margem da lei não teme as autoridades policiais e matar tornou-se banal.Apesar da incapacidade em decorrência da infra-estrutura precária, forças policiais tentam coibir a violência, esclarecer os crimes cometidos e prender os criminosos, mesmo com uma demora que aflige aos familiares e aos cidadãos de bem. Os facínoras e meliantes agem contando com a impunidade ou, quando presos, com a possibilidade de fuga ou drástica redução da pena. Recentemente os bandidos passaram a agir sempre com um delinqüente de menor idade para assumir os latrocínios. O sistema judicial é lento em punir os delinqüentes, mas extremamente rápido na concessão de benefícios, em particular para os poderosos. Há corrupção em todos os níveis e setores. A população sente-se desprotegida, não sabe a quem recorrer e não confia nas autoridades. O momento é de reagir por tantos pais, filhos, filhas, mães e amigos que tiveram seu bem mais precioso, a vida, ceifada pela brutalidade. Não podemos deixar de mencionar os policiais civis e militares que tombaram no combate ao crime. Levantemos a voz para mostrar nossa indignação com o caos instalado no Pará e na outrora “Metrópole da Amazônia”. Não suportamos mais a violência! Quantos Lauandes, Rafaeis, ainda deverão ser sacrificados?!Quais são as causas desse quadro assustador? Muitas. Apesar das louváveis exceções, a notória incapacidade dos órgãos policiais e judiciais em coibir e punir de maneira eficiente e exemplar a criminalidade certamente é uma das causas, mas nem de longe a única. Infelizmente estabeleceu-se na sociedade um clima generalizado de aceitação do consumo e tráfico de drogas, da pobreza, da desagregação dos valores familiares, do desemprego crescente e da distribuição de renda extremamente injusta que há no país. Nesse contexto, o Movimento “Paz em Belém”, nascido de uma iniciativa dos funcionários do Museu Paraense Emílio Goeldi, logo após o assassinato do geólogo Rafael Nascimento Filho, levanta sua voz diante da crescente violência contra a dignidade e a vida humanas. Estamos convictos de que é imperioso resgatar a noção fundamental de que todo e qualquer ser humano tem direito a viver de maneira digna e em segurança.É fundamental o resgate da consciência da dignidade da vida. Não podemos esperar a solução do problema da violência pelo mero combate direto à criminalidade. É preciso atingir suas causas mais profundas, e essas residem na própria organização social. Sobretudo, é preciso reconhecer que a violência em si gera cada vez mais violência. Todo e qualquer ser humano precisa ser reconhecido, respeitado e protegido em sua dignidade e seu direito à vida. Princípio que vale para a população que se sente ameaçada e exposta aos perigos da violência na rua, no trabalho e no seu seio familiar. Mas vale também para os próprios criminosos que devem ser coibidos em seus intentos e punidos exemplarmente em seus crimes, objetivando sua reabilitação social.Mencionamos como indispensável a construção da paz e da justiça social, através de mecanismos políticos e legais que garantam o atendimento das necessidades básicas de toda a população, quais sejam, a educação, a saúde, a nutrição, a moradia, a segurança, entre outras. Acima de tudo deve ser fomentado um processo permanente de educação para a paz, a justiça e a solidariedade. O caminho passa pelo incentivo a todos os agentes educativos, a começar pela família, seguindo-se o sistema educacional, mas também as organizações da sociedade civil, para se inserirem decididamente em programas, iniciativas e esforços de construção de uma mentalidade e cultura de paz.Para fechar o ciclo o Estado precisa combater a criminalidade de maneira correta e eficaz. Isto se dá pela agilidade dos processos legais, policiais e judiciais, Entendemos que a solução para a violência também passa pela qualificação e melhor remuneração das forças policiais (civis e militares), bem como pela exoneração de maus funcionários que usam o aparelho policial e o sistema judiciário muitas vezes a serviço da criminalidade. Sem dúvida nenhuma, é indispensável um sistema judicial mais ágil e, sobretudo, não discriminatório para os pobres e não permeável a privilégios. Outro ponto de reflexão diz respeito aos mecanismos jurídicos e legais que deixam brechas para que os meliantes possam usar jovens infratores para assumirem culpas por homicídios, como recentemente aconteceu no assassinato do colega Rafael Nascimento Filho.A impunidade que grassa no país precisa ter um fim. Com punições eficientes e exemplares. A motivação nunca deve ser o desejo de retribuição e vingança, mas sempre o empenho pela proteção da sociedade.O Movimento Paz em Belém clama por ampla reflexão e posicionamento do Estado e dos nossos governantes com relação à violência. Contudo, não devemos esperar apenas a ação do Estado. Cada um de nós deve ser um instrumento de transformação e de mudanças. Que possamos mudar este quadro social de violência e de crime, pois como dizia o filósofo Pitágoras: “Educai as crianças e não será preciso punir os homens”.
Movimento Paz em Belém. Belém, 28 de setembro de 2007
Em nome do Movimento Paz em Belém:
Amílcar Mendes – Coordenação de Ciências da Terra e Ecologia /Museu Goeldi
Maria Emilia Cruz Sales - Coordenação de Ciências da Terra e Ecologia /Museu Goeldi
Rosana Nascimento – socióloga, viúva de Rafael Nascimento Filho
Joice Bispo Santos – Assessoria de Comunicação Social / Museu Goeldi
4 comentários:
Luande, eu estou tentando montar um "movimento" de reinvidicação contra essa violência que a cada dia que passa nos assombra ainda mais. A idéia é enviar um apelo a vários e-mails e tentar fazer com que o maior número de pessoas leia e adira nessa luta. Temos um e-mail assaltados@gmail.com, no qual as pessoas que gostarem da idéia mandariam seu nome completo para montarmos uma lista de reinvidicação.
Posteriormente, montaremos um site, que irá facilitar a organização. A princípo gostaria de convidá-lo a participar, mas também gostaria de saber se você me dar a liberdade de usar fragmentos do seu texto para enviar as pessoas. Qualquer resposta você pode enviar para o meu e-mail? marcelinha_az@hotmail.com
Brigada pela atenção.
considero a iniciativa de criar esse espaço de reflexão sobre esse problema que atinge direto e indiretamente a todos os cidadãos.Gostaria de contactar com voces, pois tenho interesse de desenvcolver um projeto sobre cultura de paz que desejo ter a ciulminancia como trabalho de conclusão do curso de graduação em história, desde já agradeço o contato para o email:bellemjhose@bol.com.br, um grande abraço. José Belém da Costa.
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